22.01.2014

Vamos matar-nos. Agora. Vamos matar-nos. Começamos por beber muito, demasiado, não o suficiente porém. Vamos ingerir tudo rapidamente. Pele de galinha e cara feia enquanto engolimos o veneno com fervor. O trago amargo de um álcool barato a escorrer por nós abaixo. Vamos inspirar uns riscos do que houver. Ou meter uma agulha na veia do braço esquerdo. Ter um orgasmo sem o ter com a droga a fervilhar dentro de nós. Vamos matar-nos. Agora. Fazer sexo com desconhecidos numa esquina qualquer. Gemer no ouvido de alguém sem o amar. Se o amarmos é porque já estamos mortos podres e ao abandono numa caixa de Perdidos e Achados. Vamos bater em alguém. É isso! Um olho negro. Uma costela partida. Uma mão inchada. Tossir sangue. A grande dor de sentir alguma coisa, ah! Vamos matar-nos. Agora. E vamos matar um homem também. Assassina-lo na banheira para morrer como veio ao mundo. Deixa-lo degolado e afundado no seu próprio sangue. Ou então sufocado numa almofada. Eu em cima dele. Os seus braços agitados contra a minha cara até ao último suspiro. Tu sentado quieto passivo numa cadeira a meu lado enquanto fumas um cigarro e sorris. As unhas do defunto ainda quente marcadas no meu rosto. Vamos matar-nos. Vamos matar-nos. Agora!  Enfiar os nossos dedos goela abaixo e entupir as entranhas com comprimidos. Vamos matar-nos. Um tiro certeiro no peito. Uma facada profunda torcida sem piedade no estômago. Enterrar-nos vivos até sucumbirmos. A nossa vida ceifada sem misericórdia. Vamos matar-nos. Agora. Temo que nenhum outro bocado de carne que não tu compreenda isto. Vamos matar-nos. Agarra-me o pescoço. Vamos beijar-nos. Os lábios. Os ombros. As mãos. As mãos! Vamos matar-nos. Vamos beijar-nos. Vamos matar-nos! Agora. E depois vamos abandonar-nos porque é assim que as coisas são. Já ninguém se quer para sempre. Nós também não somos para sempre, de qualquer forma.... Vamos matar-nos. Agora. Vamos matar-nos e voltar para as nossas vidas. Tu para o teu emprego das nove às quatro. Eu para os meus estudos para os meus escritos para as minhas alucinações. Nós já estamos mortos de qualquer maneira. Existirão por aí cabrões que nos julgam loucos. Não é que têm razão? Que bom ser louco ai que bom, vamos matar-nos. Vamos matar-nos e regressar ao sítio triste velho oco gasto onde somos obrigados a estar vivos. Afinal de contas temos de ser normais. Uma ovelha atrás da multidão. Um acenar de cabeça. Sim senhor. Ser violado contra a parede de uma casa abandonada sem piar. Consentir tudo. Que filha da putice. Vamos matar-nos puto!